Sincronize com a notícia

COMO SERÁ O JULGAMENTO NO STJ QUE PODE MANTER OU ANULAR AS CONDENAÇÕES NO CASO KISS

A terça-feira (13) será decisiva para o destino dos quatro acusados de serem os responsáveis pelo incêndio na boate Kiss, que matou 242 pessoas em 2013, em Santa Maria. Magistrados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vão julgar se a condenação desses réus — dois donos da danceteria e dois integrantes da banda musical que se apresentava no estabelecimento —, ocorrida em dezembro de 2021, deve ser mantida. O júri foi anulado, em 2022.

A sessão, em Brasília, tem previsão de início às 13h e será transmitida pelo canal do STJ no YouTube. Familiares das vítimas da tragédia, a maior da história gaúcha, prometem fazer pressão no local, assistindo de perto ao julgamento.

O que está em jogo é se os quatro réus serão julgados novamente — como querem seus defensores — ou se será validado o júri que os condenou a penas que variam de 18 a 22 anos de reclusão, pela morte de 242 pessoas e tentativa de homicídio de outras 636, que resultaram feridas ou com saúde prejudicada pelo incêndio.

Eles foram sentenciados em dezembro de 2021, por homicídio doloso qualificado: os jurados interpretaram que tanto os empresários como os músicos tinham consciência de que o uso do artefato pirotécnico que provocou o incêndio poderia ter sido evitado, mas, mesmo assim, essa prática — usual em apresentações na boate — foi mantida. Os advogados, contudo, alegam que nenhum dos acusados jamais imaginou que o fogo pudesse consumir a boate em decorrência de algum erro que tenham cometido.

O júri de 2021 foi anulado em agosto de 2022 pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que determinou a libertação dos quatro réus: os empresários Elissandro “Kiko” Spohr e Mauro Hoffmann e os integrantes da banda Gurizada Fandangueira Marcelo de Jesus e Luciano Bonilha.

Para tomar essa decisão, desembargadores apontaram uma série de irregularidades formais, anteriores ao julgamento:

  • três sorteios para quem seriam os jurados (e não apenas um, como é o usual)
  • ocorrência de uma reunião reservada dos jurados com o magistrado que julgaria o caso (sem a presença de defensores dos réus)
  • formulação supostamente equivocada de perguntas a que os jurados teriam de responder
  • o acesso por parte do Ministério Público ao banco de dados Consultas Integradas, o que permitiu que a acusação impugnasse dezenas de possíveis jurados que já tinham visitado parentes ou amigos no sistema prisional (sendo que o banco de dados não é acessado pela defesa dos réus).

A anulação atendeu a pedido dos defensores dos acusados. Inconformado, o Ministério Público (MP) recorreu contra a anulação do júri.

O recurso para manter a sentença foi impetrado pela subprocuradora-geral da República, Raquel Dodge, que considera que as supostas irregularidades anuladas “não trouxeram prejuízo aos réus”. Ela salienta que, conforme o artigo 563 do Código de Processo Penal, nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.

O pedido de Dodge é para que a sentença do júri seja validada e, além disso, os réus voltem para a prisão. Ela tem um recurso similar também no Supremo Tribunal Federal (STF), que só será julgado caso o MP perca no STJ.

 Em seu recurso, Dodge defende que em caso de penas altas (como ocorre no Caso Kiss) os réus cumpram a condenação de imediato.

— O júri foi justo, e nos trâmites não houve qualquer prejuízo para os réus — endossa Pedro Barcellos Junior, advogado que ajuda na acusação, em nome das famílias de vítimas da tragédia.

Já os defensores dos acusados querem novo júri e rejeitam a possibilidade de retorno imediato dos réus aos presídios, mesmo que a condenação seja validada.

— Acreditamos que o júri será anulado, mas, se isso não ocorrer, os réus têm direito a responder em liberdade até que que a sentença seja definida (transitada em julgado). E nesse caso cabem recursos ao próprio STJ e no Supremo Tribunal Federal (STF). Não é justo que permaneçam presos — pondera um dos defensores de Mauro Hoffmann, o advogado Bruno Seligmann de Menezes.

É esse recurso movido por Raquel Dodge que será julgado nesta terça-feira pela 6ª Turma do STJ. A relatoria é do ministro Rogério Schietti. Além dele, votam outros quatro magistrados.

Se houver o entendimento de que a anulação foi inválida, o TJ deve restabelecer a sentença original, com a condenação dos quatro réus, e determinar a prisão deles. Se o STJ mantiver a anulação, os réus continuam esperando um novo júri em liberdade.

Em torno de 20 grupos de familiares e amigos de vítimas da Kiss devem estar na capital federal para assistir ao julgamento do recurso. Eles conseguiram viajar graças a recursos arrecadados numa vaquinha online para custeio de transporte, alimentação e estadia. A iniciativa surgiu assim que o júri foi anulado, no ano passado. A meta era arrecadar R$ 200 mil, mas o site informa que foram obtidos R$ 31 mil. Os parentes das vítimas prometem exibir fotos dos mortos, em desfile silencioso organizado em frente à sede do STJ.

Passo a passo do julgamento do recurso

Confira os trâmites do recurso do Ministério Público que pede manutenção do resultado do júri que condenou os quatro réus no Caso Kiss:

Acusação

Está prevista sustentação oral de cada ponto de vista. Nesse caso, os primeiros a falar, a partir das 13h, devem ser os acusadores, no caso, um representante do Ministério Público ( a procuradora de Justiça Irene Soares Quadros, do Rio Grande do Sul).

O advogado de acusação que representa os familiares de vítimas, Pedro Barcellos Junior, também pode ser chamado. O tempo regulamentar é de 30 minutos.

Defesa

Os defensores dos quatro réus terão 30 minutos para fazer a defesa (caso seja permitida sustentação oral do caso). Ou seja, média de sete minutos para cada um. São eles:

  • Bruno Selligman de Menezes, na defesa de Mauro Hoffmann
  • Jader Marques, na defesa de Elissandro Spohnr
  • Jean Severo, na defesa de Luciano Bonilha
  • Tatiana Borsa, na defesa de Marcelo de Jesus

Relatoria

Em seguida, fala o juiz relator do caso, ministro Rogério Schietti. Ele pode trazer o voto escrito de casa (o que é comum), improvisar ou até mudar o que escreveu, após escutar os argumentos de defesa e acusação (o que é raro). Não há tempo regulamentar para o voto dos magistrados.

Voto da turma

Após a explanação do relator, votam outros quatro ministros da 6ª Turma do STJ:

  • Laurita Vaz (presidente do colegiado)
  • Sebastião Reis Júnior
  • Antonio Saldanha Palheiro
  • Jesuíno Rissato (desembargador convocado)

Muitas vezes os julgadores também trazem seus votos escritos. Em outras, não. Podem acompanhar o relator e sequer se pronunciar. Ou podem discordar e sustentar, verbalmente, os motivos da sua discordância.

Final

Após os votos, a presidente da turma proclama o resultado. É possível que na mesma hora seja determinado ao TJ que mande prender os réus, caso a condenação seja mantida. Se o STJ mantiver a anulação, os réus continuam esperando um novo júri em liberdade.


Fonte: GaúchaZH